13 set, 2018
Oitava Alteração à Lei da Nacionalidade
A Lei orgânica nº 2/2018 de 05/07 de 2018, veio introduzir alterações significativas à Lei da Nacionalidade.
Note-se a particularidade destas alterações terem entrado em vigor imediatamente após a publicação da Lei. Ou seja, as alterações efetuadas à Lei da Nacionalidade são aplicáveis desde 06/07/2018, independentemente do facto do Regulamento da Lei da Nacionalidade não ter, ainda, sido alterado.
Contudo, e no que toca à aplicação destas alterações aos processos pendentes, apenas as alterações ao disposto nos art.ºs 30 (aquisição da nacionalidade por mulher casada com estrangeiro) e o nº 3 do art.º 9º (a prova da inexistência de condenação por prática de crime com pena de prisão igual ou superior a 3 anos para efeitos de oposição à aquisição de nacionalidade pelo Ministério Público ser feita pela apresentação de registo criminal), são de imediato aplicáveis. Isto significa que apenas os novos casos que derem entrada após 06/07/2018 beneficiarão das demais alterações.
São várias as alterações, e transversais a todo o articulado da lei, o que não será de estranhar quando considerarmos que esta lei orgânica resulta da conjugação de 5 propostas de lei apresentadas por praticamente todos os Partidos com assento parlamentar.
Seria contraproducente centrar num único artigo escrito a análise a todas elas.
Porque as alterações mais significativas são, do nosso ponto de vista, as alterações ao art.º 6º da Lei da Nacionalidade, inserido na secção respeitante à aquisição da nacionalidade por naturalização, começaremos por analisar primeiro as alterações respeitantes a este artigo, começando pelas alterações ao nº 1 do citado artigo 6º.
A primeira e mais significativa alteração (do ponto de vista da aplicabilidade prática), é que a partir de dia 06/07/2018, o tempo mínimo de residência legal para obtenção da nacionalidade portuguesa passa a ser de 5 e não de 6 anos.
Isto significa que quem resida legalmente há mais de 5 anos em Portugal (já vamos ver em que termos), poderá optar diretamente pelo pedido de obtenção de nacionalidade portuguesa, sem passar pelo pedido de residência permanente. Terão, contudo, de residir legalmente em Portugal à data da entrada do pedido, e permanecer a residir legalmente em Portugal durante o tempo em que o processo esteja pendente.
A redução do prazo resulta da intenção do legislador uniformizar os prazos previstos na Lei a este propósito, especialmente na Lei dos Estrangeiros, que é, em regra, o de 5 anos.
A este propósito, falemos sobre a alteração ao art.º 15º da Lei da Nacionalidade.
Esta alteração é, talvez, aquela que maior impacto terá em termos de aplicabilidade prática, já que torna muito mais abrangente o universo de cidadãos estrangeiros elegíveis à obtenção da nacionalidade portuguesa.
Centremo-nos no aditamento do nº3 ao citado art.º 15º.
Dispõe, agora, o nº 3 do art.º 15º da Lei da Nacionalidade, que “para os efeitos de contagem de prazos de residência legal previstos na presente lei, considera-se a soma de todos os períodos de residência legal em território nacional, seguidos ou interpolados, desde que os mesmos tenham decorrido num intervalo máximo de 15 anos”
Ou seja, deixa de ser exigível que o cidadão estrangeiro esteja a residir nos últimos 6 anos em Portugal, à data da entrada do pedido (contabilizando-se este prazo de forma contínua, retroativamente a esta data) para se considerar todos os períodos de residência, seguidos ou interpolados, que perfaçam 5 anos, num intervalo máximo de 15 anos!
Era sabido que a residência permanente é um direito adquirido que não caduca caso o beneficiário tenha estado ausente do país por um determinado período de tempo (menos de 185 dias), ou tenha estado ausente no país da sua naturalidade a trabalho ou para estudar. No entanto, para dar entrada do pedido de nacionalidade por residência, a conservatória continuava a exigir que fosse apresentado cartão de residência válido, apesar do direito à residência permanente continuar a existir independentemente deste, fora das situações previstas no artº 85º da Lei dos Estrangeiros.
O resultado mais grave surgia quando os beneficiários, regressados a Portugal com o cartão de residência permanente caducado, se dirigiam diretamente ao SEF sem consultar um advogado para renovar o cartão e, e eram, mais das vezes, induzidos em erro, acabando por dar entrada de um novo pedido de autorização de residência temporário! Em virtude de um erro grosseiro das entidades administrativas, isto significava que o titular de um direito de residência permanente, tivesse agora que aguardar mais 6 anos para poder pedir a obtenção da nacionalidade portuguesa, já que o SEF e a Conservatória entendiam que este novo pedido de residência temporária interrompeu o prazo de 6 anos exigido, forçando ao início da contagem, inviabilizando a obtenção de nacionalidade portuguesa.
O mesmo sucedia caso um cidadão estrangeiro tivesse obtido autorização temporária, e se tivesse, entretanto, ausentado do país, por ausência de condições de renovação ou por qualquer outro motivo.
Para obter a nacionalidade, teria de ter cá permanecido por pelo menos 6 anos seguidos para poder obter a nacionalidade portuguesa ou 5 para pedir a autorização de residência permanente.
Ora, neste momento, qualquer cidadão estrangeiro que nos últimos 15 anos tenha residido em Portugal, seguido ou interpolado, por pelo menos 5 anos, seja através de que título for, tem direito a obter a nacionalidade portuguesa.
Mais, isto significa que haverá cidadãos estrangeiros que mesmo que não sejam elegíveis para residência permanente, sê-lo-ão para efeitos de aquisição de nacionalidade portuguesa.
Outra alteração, digna de nota, é a do requisito previsto na alínea d) do nº 1 do art.º 6.
Anteriormente, a exigência era a de que, para obter a nacionalidade portuguesa, o requerente não tivesse sido condenado, com trânsito em julgado da sentença, pela prática de crime punível com pena de prisão de máximo igual ou superior a 3 anos, segundo a lei portuguesa.
Ora, significava isto que mesmo que a pena efetivamente aplicada não fosse a pena de prisão, porque a mesma tivesse sido substituída por pena de multa, trabalho a favor da comunidade ou qualquer outra sanção dentro das já significativas possibilidades previstas pelo Código Penal (na esteira daquele que é o fundamento do nosso sistema penal de reabilitação do agente e da sua ressocialização), ainda assim, se o crime pelo qual foi acusado e condenado, fosse, em abstrato, punível com pena de prisão de máximo igual ou superior a 3 anos, o requerente não poderia obter a nacionalidade portuguesa.
O legislador veio agora alterar esta disposição – no meu entender de uma forma bem mais equilibrada e justa face ao resultado da sua aplicabilidade ao caso concreto – no sentido de que o residente que pretenda obter a nacionalidade portuguesa não poderá ter sido condenado, com trânsito em julgado da sentença, com pena de prisão igual ou superior a 3 anos. Parece ter lido a mesma coisa? Não, de todo. A diferença é abismal. Apenas quem tenha sido condenado efetivamente em pena de prisão igual ou superior a três anos está, agora, impedido de obter a nacionalidade portuguesa.
Esta alteração resulta da proposta do Grupo Parlamentar do Governo Socialista, que expõe que com esta alteração, pretendeu optar-se “pela avaliação da medida concreta da pena a que o requerente possa ter sido condenado, ao invés de atender à moldura penal máxima do tipo de ilício, que não permite ponderar devidamente a culpa e a gravidade do ilícito e retirar consequências ponderadas em sede de atribuição da nacionalidade.”
Isto não quer dizer que a condenação tenha ocorrido apenas em território nacional, contudo, é à luz do regime penal português que qualquer condenação será avaliada.
Portanto, independentemente da origem da condenação, se a mesma não for por pena de prisão igual ou superior a 3 anos, o residente é elegível à obtenção de nacionalidade portuguesa (verificados que estejam os demais requisitos, claro está).
Também não significa que a condenação redunde na aplicação de uma pena de prisão EFETIVA igual ou superior a 3 anos. O que significa que mesmo que na sentença o Tribunal tenha optado pela suspensão da mesma, a simples condenação em pena de prisão, efetiva ou não, esta condenação é impeditiva da obtenção da nacionalidade portuguesa.
Como pequena nota adicional, não se compreende porque o mesmo critério não foi aplicado ao disposto no art.º 1º nº 3 a propósito dos requisitos para consideração de existência de ligação efetiva à Comunidade Portuguesa para os netos de cidadão portugueses nascidos no estrangeiro, onde se optou por manter a exigência de não condenação, com trânsito em julgado da sentença, pela prática de crime punível com pena de prisão de máximo igual ou superior a 3 anos, segundo a lei portuguesa…
Mantêm-se os demais requisitos relativos à exigência de que o residente seja maior à data do pedido, de conhecer suficientemente a língua portuguesa (nível A2 – art.º 25º do Regulamento da Lei da Nacionalidade, do qual estão dispensados se forem naturais de PALOP há mais de 10 anos e residam em Portugal, independentemente de título há mais de 5 anos)) e de não constituírem perigo ou ameaça para a segurança ou a defesa nacional, pelo seu envolvimento em atividades relacionadas com a prática do terrorismo, nos termos da respetiva lei.
Seguir-se-á um artigo um pouco mais prático quanto aos requisitos de obtenção de nacionalidade por residência nos termos do disposto no nº 1 do art.º 6º à luz da nova lei orgânica (residência há mais de 5 anos, com enfoque no requisito do conhecimento da língua portuguesa), partindo-se, depois, para a análise das demais alterações nos regimes previstos nos nº 2 e seguintes deste artigo, e respetiva aplicabilidade.
Gradualmente, iremos debruçar-nos sobre todas as alterações introduzidas por esta Lei.